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sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

REGRAS TRIBUTÁRIAS ASSUSTAM INVESTIDOR

Com o surgimento de novos instrumentos financeiros ao longo da última década, apareceram também novas e diferentes regras de tributação. Tais regras dificultam muito o entendimento, a comparação e o cálculo do impacto tributário por parte dos investidores, que normalmente acabam por optar pelo instrumento mais simples e, de preferência, sem imposto. As atuais regras tributárias acabam por exigir do investidor brasileiro um conhecimento e uma atenção aos detalhes muito maior do que de qualquer outro aplicador no mundo. Aqueles poucos que enfrentam o desafio de tentar entender o nosso ambiente tributário se deparam com um emaranhado de regras que acabam por gerar, nos investidores, um verdadeiro processo de desorientação do qual só conseguem se desvencilhar com a ajuda de um consultor de investimento tributarista. 

Atualmente temos ativos que são tributados com base em alíquotas de imposto de renda (IR) diferenciadas em função: a) do prazo do ativo (quanto maior o prazo do ativo menor a alíquota) ou do prazo de permanência de investimento (quanto maior o prazo de permanência do investidor menor a alíquota); b) do instrumento: alíquotas diferenciadas em função do tipo de investimento mesmo que semelhantes (compra direta de ações x fundos de ações, ativos isentos x tributados); c) que tributam o ganho de capital, mas não os rendimentos; d) que possuem mecanismos de antecipação de IR (come-cotas dos fundos) e e) alíquotas diferenciadas em função do tipo do investidor (pessoa física, jurídica, fundo de pensão e investidor não residente). Tal divergência de critério também se aplica ao IOF aumentando ainda mais a complexidade e o universo de combinações de cálculos de rendimento líquido dos investimentos. Adicionam-se a este cenário as diferentes formas de recolhimento dos tributos: fonte, DARF, IRPF, IRPJ, regras de compensação, responsabilidade tributária etc... 

Por que então não tornamos tudo mais simples? O simples tem a vantagem de preservar o conceito, a essência do tributo, de facilitar o entendimento, de gerar comparabilidade, mas, o mais fundamental, de preservar uma lógica de investimento sem que o viés tributário acabe por interferir nas decisões de alocação do capital. No caso do imposto de renda, ou melhor, do imposto sobre a renda, por que não cobrar uma única alíquota sobre uma mesma renda? Não importaria o prazo do ativo, o tempo de permanência do investidor, o seu risco, se a renda é oriunda de distribuição de rendimento ou sobre o ganho de capital ou o tipo de investidor. Buscaríamos assim valorizar o princípio da isonomia e igualdade tributária não só do contribuinte investidor, mas também dos diferentes tipos de investimento disponíveis, evitando as chamadas assimetrias que prejudicam os diferentes investidores, mercados e veículos de investimento, uns em detrimento dos outros. 

Por mais que tentemos buscar as razões históricas que justifiquem a atual configuração de benefícios tributários (alongamento da dívida pública, incentivo do mercado imobiliário, do mercado agrícola, da poupança de longo prazo, do capital de risco, do investimento estrangeiro etc...), quando todos eles são concedidos ao mesmo tempo estabelece-se um sistema que contraria a sua própria razão de existência. A lógica invertida é aquela em que a maioria dos investimentos é isenta ou possui condição tributária favorecida e a exceção é a tributação. As regras atuais não privilegiam aquilo que parece ser o caminho mais simples: a busca de um sistema tributário que estimule o aumento da poupança nacional de forma equilibrada e o desenvolvimento do mercado de capitais. 

Quando o aspecto tributário afeta a lógica de investimento aumenta-se a chance de provocarmos drásticos desequilíbrios. Investimentos que possuem maior retorno esperado normalmente apresentam maior risco e vice-versa. Todavia se um investimento de baixo risco usufrui de benefício fiscal, mesmo que apresente um menor retorno nominal esperado, poderá apresentar maior retorno líquido de tributos. Ao longo do tempo tal investimento atrairá mais recursos e investidores e o resultado será uma macroalocação de capital em ativos com menor retorno nominal esperado. 

Outros impactos são: a dificuldade de se definir um preço de mercado para os ativos, tendo em vista que o seu valor intrínseco é afetado pelas diferenças de condição tributária do investidor ou do tipo de investimento, desestimulando, por sua vez, a existência de um mercado secundário; o não estímulo ao desenvolvimento educacional do investidor que sempre preferirá os ativos de menor risco e maior retorno líquido e a falta de comparabilidade entre os diversos instrumentos uma vez que as diferenças tributárias são mais relevantes que a análise dos riscos de mercado, liquidez e de crédito. 

Portanto, um regime tributário simples e que privilegie a lógica de investimento trará grande evolução para o desenvolvimento do mercado de capitais e para a redução do custo da dívida privada. 
Ricardo Augusto Mizukawa é Superintendente executivo responsável pela área de produtos da Bradesco Asset Management (Bram). 

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